O julgamento dos Embargos Declaratórios interpostos pela União junto ao RE nº 574706 (Tema 69 do STF) que estava previsto para o dia 01/04/2020, foi excluído do calendário de julgamento pelo Presidente Dias Toffoli, na data de 24/03/2020.
Os contribuintes continuam na insegurança jurídica a respeito de um tema que se arrasta por muito tempo, vindo à tona a discussão da modulação dos efeitos da decisão nos Embargos de Declaração.
Entre alegações de omissões e contradições, a Fazenda Nacional requereu a modulação dos efeitos do julgado, para que eles sejam produzidos apenas a partir do julgamento dos embargos.
Com o intuito de garantir a segurança jurídica e proteger o interesse social, a modulação de efeitos pode ser adotada para determinar que uma decisão do STF tenha eficácia prospectiva ou a partir de uma data estabelecida pelo tribunal, quando um entendimento do STF modifica o posicionamento anterior do tribunal ou declara determinada lei inconstitucional.
Assim, o STF pode decidir, caso a caso, a partir de quando sua decisão valerá, considerando questões atinentes ao julgamento.
O STF consignou que os embargos de declaração são o instrumento adequado para pleitear a modulação do julgado, uma vez que, regra geral, a decisão que declara a inconstitucionalidade de uma lei tem efeitos retroativos, respeitando a ideia de que a lei inconstitucional nasce inconstitucional.
Desta forma, enquanto os referidos Embargos de Declaração não forem julgados, os contribuintes não sabem que rumo tomar e neste atual estágio de calamidade pública que o país atravessa ter o crédito disponível pode representar um grande fôlego de caixa para a empresa.
Existem muitos contribuintes com ações transitadas em julgado, reconhecendo o direito à exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS.
Contudo, a habilitação do crédito vai passar pelo crivo da RFB, mediante um procedimento administrativo, normatizada pela COSIT 13/2018. Esta norma da RFB estabelece que os valores a serem excluídos da base de cálculo do PIS e da COFINS são aqueles valores de ICMS mensal a recolher e com este tipo de cálculo apresentado, o contribuinte consegue a habilitação para fazer as devidas compensações com os tributos federais do mês corrente.
Existem algumas decisões que versam expressamente que o ICMS a ser excluído da base de cálculo do PIS e da COFINS é o valor que compôs a sua base no ato do cálculo das referidas contribuições sociais. Com tais decisões já transitadas em julgado, o contribuinte pode habilitar o seu crédito e utilizá-lo, mas para que isso seja factível, há se ter expressamente esta forma autorizativa exarada pelo Judiciário.
Caso contrário, o crédito a ser habilitado será aquele feito de acordo com a COSIT 13/2018, que em tempos de crise, não é o melhor dos mundos, mas já é um alento.
A título ilustrativo, segue um breve histórico, publicado no site https://www.migalhas.com.br/quentes/320611/decisao-do-stf-sobre-icmsna-base-de-calculo-do-pis-cofins-pode-causar-inseguranca-juridica, na data 02/03/2020, com a atualização da retirada de pauta do processo supra citado:
Histórico
1998
O primeiro processo pelo qual o STF se debruçou sobre o tema data de 1998 (RE 240.785). Trata-se de recurso da empresa Auto Americano Distribuidor de Peças contra uma decisão do TRF da 3ª região, que julgou ser constitucional a inclusão do ICMS na base de cálculo da Cofins. Nas vicissitudes de seu andamento, foi levado ao pleno em 2006.
2006
Sete ministros se pronunciam sobre o tema. Seis pela inconstitucionalidade da cobrança: Marco Aurélio – relator, Cármen Lúcia, Lewandowski, Ayres Britto, Cezar Peluso e Sepúlveda Pertence. E apenas um, Eros Grau, pela constitucionalidade. Mas o julgamento foi suspenso por pedido de vista de Gilmar.
2007
A essa altura, como se viu, a maioria já havia decidido a questão. Qualquer medida que o governo quisesse tomar, era entrar em campo com um 6 a 1. No entanto, um dos que havia votado contra os interesses do governo, ministro Sepúlveda Pertence, aposenta-se antes do esperado (em 15 de agosto).
Alguns dias depois (5 de setembro), o ministro Menezes Direito toma posse. O que faz o governo? Entra, em 10 de outubro, com uma nova ação: a ADC 18. O objeto? O mesmo daquele primeiro RE que estava com pedido de vista. Só que, agora, há outro juiz apitando o jogo. A ação, coincidentemente, tem como relator justamente o novo ministro Menezes Direito.
2008
Em 25/4/2008, os ministros decidem pela existência de repercussão geral em um novo RE (574.706) com o mesmo pedido, de autoria de uma empresa de exportação e indústria de óleos do Paraná, relatado pela ministra Cármen Lúcia.
Em 15/5/08, enfim, o STF colocou em pauta, de uma vez, o primeiro RE e a ADC. Na ocasião os ministros decidiram, por maioria, em questão de ordem, que deveriam primeiro julgar a ADC, sob o argumento de que seus efeitos seriam mais amplos (controle concentrado), e abarcariam o RE (controle difuso).
A situação faria com que a discussão tivesse que começar do zero. Quer dizer, em evidente ofensa à lógica jurídica, um RE praticamente julgado é “pausado”, e os ministros passam a se debruçar sobre outro processo. Mas foi isso mesmo que fez o STF, não sem incisivos protestos do ministro Marco Aurélio – que acabou por pedir vista na ADC. A Corte, todavia, manteve a precedência do controle concentrado, não julgando o RE até solução da ADC.
Em agosto de 2008, o plenário decide deferir liminar na ADC 18, suspendendo todos os processos em tramitação na Justiça que discutissem a inclusão do ICMS na base de cálculo da Cofins, até que fosse julgado o mérito da ação proposta pelo presidente da República.
“A suspensão desses processos todos é uma vitória da União”, comemorou o então advogado-Geral da União, Dias Toffoli. A comemoração se deu porque, segundo informações da Secretaria da Receita Federal, divulgadas pelo próprio STF, os tributos recolhidos que estavam sendo questionados por estes processos somavam cerca de R$ 80 bilhões. À época, o AGU revelou que eventual decisão negativa na análise da ADC poderia levar a uma perda anual de arrecadação de R$ 12 bilhões.
2014
A solução parecia chegar finalmente em 2014, quando, em agosto, o relator do primeiro RE (240.785), ministro Marco Aurélio, pediu à presidência a continuidade do feito, destacando que já havia maioria formada.
“Urge proceder à entrega da prestação jurisdicional às partes.”
O pedido se deu após a empresa recorrente apresentar questão de ordem requerendo a sequência do julgamento do RE, em homenagem ao princípio da segurança jurídica e da duração razoável do processo.
O pedido foi atendido e, em 8 de outubro, os ministros decidiram naquele recurso, por maioria, que o ICMS não compõe a base de cálculo da Cofins. A decisão, porém, beneficiaria apenas e tão somente a empresa envolvida no recurso, uma vez que não possuia efeito erga omnes. Ou seja, decidido, mas não decidido.
Votaram naquela oportunidade os ministros Celso de Mello, que acompanhou o entendimento da maioria no sentido de que o ICMS não compõe a base de cálculo da Cofins, e o ministro Gilmar Mendes, com a divergência, sob o entendimento de que o ICMS compõe o preço do produto, e por essa razão deve integrar a chamada “receita bruta”. Na ocasião, o ministro ressaltou preocupação com possível “ruptura do sistema tributário”, uma vez que o esvaziamento da base de cálculo da Cofins resultaria em “expressivas perdas”.
A ministra Rosa não participou da votação, porque não havia participado também dos debates. Da mesma forma, não votaram Barroso, Teori, Fux e Toffoli, porque ocupavam cadeiras de ministros aposentados que já haviam se pronunciado no debate daquele específico feito.
Quer dizer, decidiu-se, mas ainda era desconhecido o posicionamento do novo colegiado. O entendimento ainda poderia ser mudado no julgamento do RE 574.706, de relatoria de Cármen Lúcia, que teve repercussão geral reconhecida, ou mesmo da ADC.
2017
O segundo recurso que debatia o ICMS na base de cálculo, que como já dito era de relatoria de Cármen Lúcia, foi finalmente julgado em março de 2017, quando os ministros decidiram (novamente) que o ICMS não compõe base de cálculo do PIS e da Cofins. Por 6 votos (Cármen, Rosa, Fux, Lewandowski, Marco Aurélio e Celso de Mello) a 4 (Fachin, Barroso, Toffoli e Gilmar), foi fixada tese para fins de repercussão geral.
A questão da modulação, por sua vez, não foi dirimida, permanecendo a situação de insegurança jurídica. Cármen disse que não constava no processo nenhum pleito nesse sentido. Sem requerimento nos autos, nada de votar modulação, disse a ministra corretamente.
Em outubro de 2017, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional opôs embargos de declaração. Na petição, inovou requerendo a modulação dos efeitos, para que a decisão passe a valer após o julgamento dos embargos, destacando o argumento ad terrorem do impacto financeiro e orçamentário, bem como dificuldades operacionais para a aplicação retroativa do entendimento.
A ADC, naquele momento, não estava liberada para julgamento, e por isso, não foi pautada conjuntamente.
2018
Ante o resultado de 2017, em setembro de 2018, em decisão monocrática, Celso de Mello julga prejudicada a ADC 18, em face da perda do objeto.
2019
Em junho de 2019, a PGR apresentou ao STF parecer favoravel à modulação. Nos embargos de declaração da União no RE 574.706, manifestou-se pelo parcial provimento, “de modo que o decidido neste paradigma da repercussão geral tenha eficácia pro futuro”.
“Os embargos declaratórios podem e devem ser acolhidos para que se proceda à modulação dos efeitos do julgado. O acórdão traz em si impacto e abrangência que impõem seja sua eficácia lançada pro futuro, com efeitos ex nunc. (…) A tese fixada em repercussão geral – com eficácia vinculante e efeitos ultra partes – produz importante modificação no sistema tributário brasileiro, alcança um grande número de transações fiscais e pode acarretar grave impacto nas contas públicas.”
O processo chegou a constar da pauta de dezembro passado, mas foi retirado.
2020
O julgamento estava com agendamento para o dia 1/04/2020, porém foi retirado de pauta pois pretende-se que o julgamento seja de forma presencial.
Com os reflexos das restrições ocasionadas pelo combate à COVID-19 não há, ainda, nova pauta fixada para o julgamento.
Barueri/SP, 06 de abril de 2020.
MARCIA BACCHIN BARROS